quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Bonequinha de Luxo



No último mês de Julho a rede Cinemark reexibiu alguns clássicos do cinema, dentre eles o maravilhoso Breakfast at Tiffany's.

Depois de ver essa obra prima do Blake Edwards na telona, saí decidida a ler o livro que permitiu que um filme tão lindo acontecesse. Até para conhecer um pouquinho da obra do célebre Truman Capote.

Nem preciso dizer que é muito particular essa sequência de ver o filme antes de ler o livro que o originou. Os mais puristas devem se retorcer pensando nessa leitura enviesada, associando o texto a imagens do filme que diferem de uma imaginação ainda não maculada pela projeção.

E mais estranho que ver um filme que não corresponde às suas ideias dos personagens é constatar as diferenças lendo depois - sensação esquisita de estar diante de uma carta reveladora que vai te fazer relembrar os fatos com outros olhos.

Mas olha, adorei! Mesmo o livro despertando sensações totalmente diferentes do filme.
Claro, afinal o livro não tem trilha sonora do Henry Mancini, nem os trejeitos encantadores da Audrey. E não mesmo, porque a Holly Golightly do livro é uma loira de olho azul! E às vezes parece mais uma ~outra coisa~ de luxo do que a bonequinha mais recatada (bom, também não é pra tanto!) do filme.

Mas apesar de detalhes como esse parecerem cruciais, a semelhança entre os textos é impressionante.
Os diálogos do filme são réplicas exatas do livro, e ver no papel as excelentes tiradas da Holly e falas encantadoras de outras personagens me fizeram reviver momentos deliciosos da película e valorizar ainda mais essa escrita inteligente e cativante do Capote.

"It should take you about four seconds to walk from here to the door. I'll give you two."
"A girl can't read that sort of thing without her lipstick."

Por outro lado, o filme é desenrolado sem narração, de forma onipresente, costurando cenas de ambientes com ou sem a Holly, com ou sem os demais personagens. O que gera uma grande surpresa ao abrir a primeira página do livro e perceber que o livro é narrado em primeira pessoa pelo Paul! E ainda nessa mesma página vemos que os desfechos serão bem diferentes.

Toda essa diferença entre as obras me fez pensar em outro filme, "Miranda e Miranda" do Woody Allen. Não lembro de ter gostado muito não, mas tinha uma premissa bem bacana: contar a mesma história duas vezes - uma como um drama e outra como uma comédia. Mas a verdade é que essa sensação agridoce da obra já é prevista por Capote.


Capote te prende na trama. Desenvolve personagens cheios de imperfeições verossímeis (ciúme, vaidade, orgulho) porém repletos de particularidades charmosas e igualmente críveis. Mas para mim, é na escolha de palavras que ele conquista. Pelo menos é sempre assim que os autores me conquistam.

"There was a consequential good taste in the plainness of her clothes, the blues and grays and lack of luster that made her, herself, shine so."
"(...) she received V-letters by the bale. They were always torn into strips like bookmarks. I used occasionally to pluck myself a bookmark in passing. Remember and miss you and rain and please write and damn and goddamn were the words that recurred most often on these slips; those, and lonesome and love."

Apesar de diferenças de trama que eu não poderia detalhar aqui sem spoilers, uma diferença que mais me impressionou não interfere na trama. No livro, Holly não vai nunca tomar um café da manhã em frente à Tiffany's. Aquela cena lindíssima de abertura, que define a personagem da Holly em segundos - vivendo num caos com o mais alto grau de elegância - é cem por cento Blake Edwards.


Enquanto no livro, o título é uma brincadeira em cima das falas de Holly, que também a definem com êxito:

"I want to still be me when I wake up one fine morning and have breakfast at Tiffany's."
"If I could find a real life place that made me feel like Tiffany's, then I'd buy some furniture and give the cat a name!"

Fiquei pensando como seria o filme sem a cena do café da manhã. E cheguei a conclusão de que o livro é perfeito. Mas ainda bem que o filme é diferente.

Perfeito também.


2 comentários:

Dri Mattoso disse...

deu vontade de ler o livro também!

Lúcia disse...

Então leia, leia mesmo!
Faz pouco tempo que li, mas já me pego com saudades e querendo reler :)